Sunday, January 22, 2006

Comoedia Finita Est

E pronto. Estou neste momento a acompanhar os resultados reais, pelo site do STAPE, e tudo se parece confirmar: 50, 84% para Cavaco; 20,70% para Alegre; 14,09% para Soares; 8,69% para Jerónimo; 5,25% para Louçã e 0,43% para Garcia Pereira. Tudo bastante dentro dos limites do que eu calculara.
O que podemos aprender daqui? Nada de novo que já não se tivesse dito: o messianismo cavaquista triunfou (pelo menos, pela leitura periclitante - a ver em que ficamos - que se pode fazer agora), o alegrismo nacionalista e independente revelou na sua plenitude "o poder dos cidadãos" e Soares veio confirmar a crise do PS, que já era anunciada quando um partido não tem senão o seu fundador, que já detivera o cargo dois mandatos seguidos, para avançar para esta corrida. A divisão fica vincada com estes resultados: ficou claro de que as eleições internas do PS que elegeram Sócrates deixaram marcas e fissuras no tecido partidário. Muitos analistas quiseram ver naquela imagem de Soares a ajudar Sócrates em canadianas a descer do palco a metáfora de como Soares acabaria por ser a força mortiz por baixo da derrocada do actual primeiro-ministro. Não se compreende como é que Sócrates apostou num candidato assim, como se quase desejasse que Cavaco obtivesse o cargo - o que, a meu ver, só dever-lhe-ia ser indesejável. A prova de que o PS estava mais que ciente da sua missão fracassada foi quando a meio da campanha promoveu a desistência dos outros candidatos à esquerda - era sinal de que de facto, por si, Soares não triunfava.
Alegre, esse é perdedor e vencedor. De um lado, é incrível a forma como mostrou que os cidadãos, não apoiados por partidos, podem concorrer. Os partidos imiscuídos nas presidenciais sempre foi algo que me desagradou - na realidade, os partidos, na sua forma de ser actual, desagradam-me de qualquer maneira (não se leia aqui incentivos à criação de um partido único: isso seria, ainda assim, um partido, logo eu não o posso estar a defender. É uma questão mais complexa que me arrependo de ter invocado para aqui, já que desviará as atenções da questão central: presidenciais). Alegre, porém, perdeu porque não foi a uma segunda volta e porque doravante nem todos o olharão com respeito dentro do PS - dor de cotovelo é atroz. Nalguns lados, na Beira, que eu conheço bem, chamam-lhe "amor de sogra". O PS é forçado a admitir - e, com ele, tu, que não inteligivelmente recusaste esse argumento que é meramente lógico, independente de qualquer vontade, objectivo ao extremo - que Alegre era o candidato mais bem colocado para congregar em seu torno os socialistas e esquerda em geral. Tudo começou mal para Sócrates desde que ele "traiu" Alegre - permiti-me a expressão. E deste ponto de vista, Alegre é capaz de ser um vencedor ainda maior que Cavaco.
Na realidade, o garnde derrotado é o PS e a figura que o encarna: Soares. Na primeira ou segunda reacção da sede soarista que as televisões transmitiram, um socialista apoiante de Soares começava já a lançar as suas farpas contra Sócrates, acusando-o de todo o mal. Começa assim a traçar-se o caminho para o golpe: Sócrates perderá as próximas eleições legislativas. Muitos temem até que ele caia ainda antes de chegarmos a esse termo. Improvável, mas não descarto de todo a hipótese - e não, não é porque Cavaco chegou agora a Presidente, mas sim porque Sócrates é mais prudente que Santana e só muito azar congregado poderia levar a gigantescas mobilizações contra o governo. Mas estamos a ler tudo já demasiado na esfera do poder executivo.

Feita uma primeira análise dos resultados, que poderei vir a rever e ampliar noutro post, segue-se agora a resposta aos teus argumentos:
1. Como vês, as sondagens eram mais do que verídicas e não adulteradas - se tivesses por um momento pensado racionalmente, ter-te-ias apercebido de que uma teoria da conspiração contra Soares era algo inconcebível. Se alguma sondagem errou, parece-me claro que foi as que tu invocaste.
2. "E não só! A candidatura de Manuel Alegre, posso estar muito enganado (ou então, não) mas não foi mais do que uma manobra de vingança contra Sócrates."
Não concordo nem desminto. É-o e não o é ao mesmo tempo. Quando Alegre o propôs pela primeira vez, não era, de modo algum, vingança. Sócrates estava no poder, ele poderia almejar poder também, mas noutro cargo, Presidente da República, mas longe de ter intentos de demitir Sócrates. Porém, quando Sócrates o rejeitou depois de o ter apoiado e se virou para Soares, aí, na persistência da sua candidatura, vejo já um certo toque de vingança - que, os resultado o confirmam, era uma vingança justa: Alegre tinha razão quando se afirmava o melhor para congregar o povo de esquerda: os números não me permitem mentir. Porém, considerar a sua candidatura exclusivamente vingança parece-me uma deturpação da realidade.
3. "Tens que admitir que Alegre se ia sentir nas suas sete quintas, tendo o poder para demitir Sócrates, ao primeiro erro que este fizesse."
Ora aqui é que tu denunciaste tudo. Porquê ser contra Cavaco, porquê contra Alegre, contra os outros candidatos? Porque só Soares dava a garantia absoluta de que não iria demitir o governo que o apoiou. E isso foi triste na campanha, porque se percebia que havia uma relação óbvia e promíscua entre Governo e candidato Soares, em que um protegia o outro. Foi uma candidatura, em parte - não na totalidade, obviamente - defensiva, isso prejudicou-a.

Assim sendo, espero agora as tuas reacções aos resultados, lamentando ter de ter um hóspede tão cabisbaixo... Nesse aspecto, o voto em branco é saudável: sabes a priori que não ganharás - não acalentas esperanças vãs... Já agora, o voto em branco, neste momento, pelo STAPE, já chegou aos 1,05% e o nulo aos 0,79%. Boas notícias para os meus.

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